quinta-feira, 11 de julho de 2013

Cavaco paga para ver


Cavaco Silva devolve a bola aos partidos do arco



Cold call
Não foi xeque-mate, porque o jogo não é de xadrez, mas de poker. O que Cavaco fez foi um cold call aos partidos do arco

A decisão ontem anunciada por Cavaco Silva (Expresso) sobre o grande bluff de Paulo Portas, descobriu a careca aos chefes partidários e deputados que querem desesperadamente eleições antecipadas, pois desta forma desviariam a atenção dos portugueses do que são as evidentes e escandalosas responsabilidades de todos os partidos políticos com assento parlamentar no atual colapso do país, precisamente no período (os próximos seis meses) em que uma mais do que provável rotura de pagamentos da dívida pública portuguesa se perfila como muitíssimo provável caso não haja um corte imediato, profundo e estrutural nos gastos do estado, nas rendas criminosas dos rendeiros do regime, e nas mordomias de uma infindável nomenclatura e burocracia de topo que insiste em manter privilégios — sob as mais esfarrapadas justificações corporativas. 

A prova cabal deste colapso iminente aparece aliás plasmada numa das últimas decisões de Vítor Gaspar, ao elevar para 90% a fração do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) que poderá vir a ser enterrada na aquisição de títulos da dívida pública portuguesa (Jornal de Negócios), a qual, como é público e notório, terá muito provavelmente que ser reestruturada. Ora se houver reestruturação, haverá inevitavelmente o chamado bail-in, ou seja, perdas substanciais dos próprios credores como parte da operação de redução e refinanciamento da dívida. No entanto, no imediato, esta decisão governamental cria uma válvula de escape para o caso de uma mais do que previsível diminuição do apetite dos fundos americanos e chineses pelas dívidas soberanas europeias. Ou seja, um prolongamento mais na agonia de um país capturado por máfias e tríades que têm conseguido impedir os corruptos políticos que nos governam e legislam de atalhar de forma corajosa e justa a inércia suicida do nosso processo de endividamento. Alguém ouviu alguma criatura do parlamento protestar perante a possibilidade de um haircut no fundo público de pensões se e quando houver a reestruturação da dívida portuguesa que a nossa desmiolada esquerda alegremente reclama?
“O Presidente da República não dá posse a novo governo saído das negociações dos partidos da coligação e, ao contrário, propõe a realização de um compromisso de salvação nacional entre o PSD, o CDS e o PS, mediado por uma personalidade de reconhecido prestigio.

Cavaco Silva surpreendeu hoje tudo e todos ao apresentar a sua “solução” para a crise, que na prática não se traduz na aceitação da proposta de coligação - “o atual governo encontra-se na plenitude das suas funções”, diz a determinado passo - fazendo depender a sua aprovação de uma nova formula governativa que passe pelo entendimento entre os partidos.

É uma espécie de “xeque-mate” aos partidos - aos da atual coligação, e também ao PS, que até agora se tinha vindo a negar a assumir qualquer compromisso de governação sem eleições.”


[...] “E o que acontecerá se nenhum deles assumir o compromisso? Se Passos e Portas preferirem que nestas condições até aceitam as eleições que o Presidente recusa?”.

Luísa Meireles. Expresso, 10/7/2013, 22:27.

Tínhamos-nos esquecido do jogador ao fundo da mesa: o Presidente da República. Cavaco pagou para ver e ganhou, pelo menos para já. Portas teve, ao que parece, mais olhos que barriga, e menos jogo do que anunciava. A tal reforma do estado não passou, pelo não visto, de uma quimera. Quem se colocar agora fora do compromisso a três (pois os anti-Troika não contam para coisa nenhuma, a não ser para continuarem a lutar por um sistema partidário oportunista e populista e por uma Constituição desdentada) será chutado para fora do tabuleiro. Ou seja, ou AJS muda de discurso ou o PS começará a desagregar-se rapidamente. Se Portas fizer mais uma asneira, o CDS esfuma-se e regressa ao táxi. Quando todas as facas caíam sobre o PM e sobre o seu ministro das finanças, ao fazer-se de morto durante o grande bluff de Paulo Portas, mantendo, porém, que não abandonaria a guerra, Pedro Passos Coelho acaba por sair, aparentemente, sem perdas irrecuperáveis deste episódio agudo da crise.

É possível que Durão Barroso tenha telefonado a Cavaco Silva sobre as consequências previsíveis de um Paulo Portas a liderar as negociações com a Troika. E é também provável que alguém tenha explicado a Cavaco Silva as consequências do assalto do CDS ao edifício laranja (uma mais do que provável cisão nos sociais-democratas).

Resta agora um enorme problema para António José Seguro. Perante o desafio do Presidente da República, que já anunciou eleições legislativas antecipadas, mas nunca antes do prazo previsto para o cumprimento dos termos do Memorando, que dirá o rapaz sem imaginação do PS? Que dirá Sampaio? E que dirá Soares? Irão optar por uma Frente Popular com o Bloco de Esquerda e o PCP? Irão anunciar que farão governo com o Bloco, mas não com o PCP? Ou continuarão a insistir pateticamente que querem governar a sós um país em bancarrota? Ou muito me engano, ou a guerra civil dentro do PS já começou.


Um compromisso assinado pelos três partidos do Memorando faz todo o sentido nesta fase desgraçada do país. Não se trata, para já, de nenhum governo de coligação alargada, mas de manter o governo em funções, pois continua a dispor de toda a legitimidade democrática, reforçando porém a sua capacidade de ação através de um compromisso alargado sobre um plano de emergência e salvação nacional. Na realidade, sem aumentar muito claramente a base de apoio político do atual governo, é impossível travar, quer as hordas golpistas do PCP e do Bloco, quer as hordas golpistas do BES, Grupo Mello, EDP e companhia.

Sem este reforço político do governo será também cada vez mais difícil negociar com os credores.

António Cerveira Pinto

1 comentário:

  1. Boa análise com uma observação: o Passos pagou e bem a parada do Portas para ficar no jogo. Sendo o último a falar, Cavaco entrou com a sua enorme "caixa" e pode ainda passar cheque. Em boa verdade, todos sabem que um próximo governo presidencial está por dias. O milagre é saber tirar as castanhas do lume sem ficarem torradas, Abraço.

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